terça-feira, 21 de agosto de 2012

Violência virou problema de Estado-Maior - Arnaldo Jabor


Sempre que escrevo sobre a violência me dá uma sensação de inutilidade. Quando vejo os movimentos de solidariedade, bandeiras brancas, pombas da paz, atores nas ruas, burgueses falando em cidadania, me dá uma sensação de perda de tempo.
Nós tratamos os criminosos como se fossem “desviantes” de nossa moral, como gente que se “perdeu” da virtude e caiu no “pecado”, no mundo do crime. Não é nada disso. Eles são os novos empregados de uma multinacional. O único emprego que lhes foi oferecido no último século: a megaempresa da cocaína. Ela trouxe o poder sobre as comunidades que, somado à ignorância e à miséria, criou a crueldade sem limites, à bruta guerra animalesca. Os bandidos violentos são quase uma mutação da “espécie social”, fungos de um grande erro sujo do qual nós somos cúmplices.
Hoje, nós é que ficamos caretas diante deste mundo periférico que não se explica, gerando outra ética, funérea, sangrenta. A miséria armada é uma outra nação, no centro do Insolúvel. Essa gente era anônima; estão ganhando notoriedade na mídia. São vazios objetos de uma corrente de pó; nós, pequenos burgueses, é que víamos neles uma vaga consciência “política” de marginais. Achamos até que eles querem calar a imprensa. Nada. Mataram por matar, chamaram o Tim de X-9 e “já era” – disseram eles.
Nós é que estamos lhes fornecendo uma “ideologia”. Mas, não quero ficar deitando sociologia barata sobre a violência. Quem sou eu? Mas, vejo com um mínimo de bom senso que os vilões também somos nós. Eles são a prova de nosso despreparo. Os incapazes somos nós, ainda crentes de leis inúteis, coerções superadas, de polícias falidas. Nós não fizemos nada quando as favelas eram pequenas. A miséria era dócil – podia ser ignorada. Agora, se não agirmos, isso vai virar uma endemia eterna. A lei não consegue nem instalar anti-celulares nas cadeias e fica encenando comboios para a mídia, com cem policiais para levar o Beira Mar para outra cadeia.
Ninguém consegue resolver nada porque os instrumentos de defesa pública estão engarrafados numa rede de burocracias, fisiologismos, leis antigas, velhos conceitos que são facilmente superados pela eficiência “pós-moderna” dos bandidos, diretamente ligados ao ato, ao fato, à instantaneidade do mal e sem freios éticos. Eles têm a mesma vantagem dos terroristas. Muito lero-lero racionalista ocidental, ciência, democracia e, aí, chega um arabezinho maluco com uma bomba e arrasa o shopping center.
Eles são uma empresa moderna. Nós somos o Estado ineficiente. Eles agilizam métodos de gestão, são rápidos e criativos. Nós somos lentos e burocráticos. Eles lutam em terreno próprio. Nós, em terra estranha. Eles não temem a morte. Nós morremos de medo. Eles são bem armados. Nós, de “trêsoitão”.
Eles ganham muita grana. (Um “aviãozinho” de 15 anos ganha mais por semana que um PM por mês.) Eles estão no ataque. Nós, na defesa... Nós nos horrorizamos com eles. Eles riem de nós. Nós os transformamos em superstars do crime. Eles nos transformam em palhaços. Eles são protegidos pela população dos morros, por medo ou vizinhança. Nossas polícias são humilhadas e ofendidas por nós.
Ninguém suborna bandido. Eles compram policiais mal pagos. Um que ganha 700 paus por mês não tem ânimo para combater ninguém. Eles não esquecem da gente nunca, pois somos seus fregueses. Nós esquecemos deles logo que passa uma crise de violência.
A droga e as armas vêm de fora. Eles são globais. Nós somos regionais. Alguma vitória só poderá vir se desistirmos de defender a “normalidade” de nosso sistema, pois não há mais normalidade nenhuma; precisamos de uma urgente autocrítica de nossa ineficiência. O combate ao crime passa pelo combate ao nosso descaso e incompetência. A luta contra o tráfico, é óbvio, começa lá longe, nas fronteiras. Por lá entram as armas e o pó. Não adianta subir e descer de morros. Temos de fechar as fronteiras.
A luta contra o crime não é mais uma luta policial; não é mais a Lei contra o Pecado. Não. O crime cresceu tanto que se tornou um problema de Estado-Maior. Sim. Trata-se uma luta política e, mais que isso, uma luta policial militar. Acho que tem de haver sim uma séria articulação das Forças Armadas com as polícias. Tem de haver generais estudando estratégias e logísticas de cercos e ataques. Meses de estudo, planos secretos, dinheiro, muito dinheiro e milhares de homens com armas modernas. E tudo isso coordenado com campanhas de esclarecimento e de proteção às comunidades que eles “protegem”.
“Ahh... – alguns vão gritar – o Exército não foi treinado para isso!” Pois, que seja treinado. Trata-se de uma guerra. Ou não? Não combateram a guerrilha urbana, com implacável ferocidade e competência?
Aposto que outros dirão: “O Exército não é para crimes comuns; é para guerras maiores...” Para quê? A invasão da Argentina? A guerra que se anuncia é subversiva no pior sentido. Não aspira a uma ordem nova. Só quer uma vingança obtusa e a manutenção da miséria como refúgio. No fundo, muitos não admitem a ação das Forças Armadas, porque desejam ocultar a derrota de um sistema legal e policial.
Pois que seja. Nosso fracasso tem de ser assumido. Do contrário, continuaremos atrás das grades de nossos condomínios, dizendo: “Que horror!” para sempre.
Crime hediondo é que isto não seja uma prioridade nacional. A tragédia das periferias brasileiras me lembra um terremoto ignorado, para o qual ninguém enviou patrulhas de salvamento. Já houve a catástrofe e todos nós tentamos esquecê-la, trêmulos de medo, blindados, com os “socilites” cheirando o pó molhado de otários, perpetuando esse poder paralelo, que tende a crescer.

11 comentários:

Anônimo disse...

ӏ am sure this рiece of wrіting has tоuched
all the inteгnet peoρle, its rеallу гeally рleaѕant piece of
wгiting on builԁing uρ new blog.

mу site; mouse click the next webpage
My web site - Buy Silk'n Sensepil

Anônimo disse...

Οh mу goοdness! ӏncredible articlе
dude! Thank you sο much, Hoωеver I am
having dіffiсultieѕ with yοur RSS.

I don't know the reason why I cannot join it. Is there anyone else getting similar RSS problems? Anyone that knows the solution will you kindly respond? Thanx!!

Also visit my web-site Hair removal Solution

Anônimo disse...

Just want to say your аrticle is as astonishing.
The cleaгness іn your post іѕ just
great and i cοulԁ аssume you агe
an expert οn this subject. Finе with yоur
permiѕsion alloω me tο gгab youг feed tο kеep up
to date with forthсoming post. Thanks a million
and please keep up the gratifying wоrk.


Feel free to vіsit my weblog - v2 cig Review

Anônimo disse...

Valuable info. Fortunate me I discovered yοur
website accidentally, and I'm stunned why this twist of fate didn't came about earliеr!
I bookmarked іt.

Feel free to surf to my homepаge - v2 cigs

Anônimo disse...

exactlу whегe do we оbtain electronic cіgаrettes

Mу wеbsite green smoke

Anônimo disse...

If you wіsh for to grow youг know-how just keep ѵisiting this ωeb site and
be upԁateԁ with thе most rеcent news posteԁ here.



Feel fгee tο ѕurf to my web ρagе: http://yips.idevcloud.com

Anônimo disse...

I'd like to thank you for the efforts you've put in writіng this blοg.
I really hopе to check out the same hіgh-grade content by you later on as ωell.

In tгuth, your creativе writing abilities has іnspireԁ me to gеt my own, personal ѕite nοw ;)

Here is my web pаge bruna-horals-Blog.blogg.asia

Anônimo disse...

My spouse and I аbsolutely love your blog anԁ find the majorіty of your post's to be exactly I'm looking for.
can yоu offeг gueѕt ωгiteгs to write content for you?
I wouldn't mind composing a post or elaborating on many of the subjects you write concerning here. Again, awesome blog!

my site; V2 cigs

Daniel Limeira dos Santos disse...

Arnaldo, como sempre, objetivo, claro, e coerente. Texto muito bem escrito. Vou ler muitos destes para aguçar meu senso crítico e melhorar meu estilo de produção textual.

Anônimo disse...


filho da puta

Anônimo disse...

I love you blog